(Uma versão da resenha abaixo foi publicada originalmente em A TRIBUNA de Santos em 23 de janeiro de 2018)
No século passado, dois projetos monumentais ficaram inacabados. Eu os chamo de livros-link, que abrem a todo momento janelas para o leitor. Em “Passagens”, de Walter Benjamin tentava-se reunir todos os dados que explicavam como Paris tornou-se a capital do século dezenove. Em “O Idiota da Família”, de Jean Paul Sartre tomava-se um indivíduo e pesquisava-se toda a sua época.
Em “MACHADO”, guardadas as devidas proporções, Silviano Santiago escreveu um livro-link e conseguiu terminá-lo. Focando os anos de viuvez de Machado de Assis e a celeuma em torno da eleição para a Academia Brasileira de Letras de seu protegido e amigo, Mário de Alencar, filho de José de Alencar e escritor medíocre. A epilepsia é o fio condutor dos temas e personagens:
— Arte com o produto da doença;
— Miguel Couto, médico de Machado de Assis e Mário de Alencar, o qual se beneficiou com a encilhada, especulação financeira e imobiliária que mudou a paisagem social na transição da monarquia para a república;
— A radical reforma urbana que transformou o Rio de Janeiro levada a diante por Pereira Passos;
— A relação do pai de Gustave Flaubert com seu filho;
— O papel de Flora no romance “Esaú e Jaco”;
— A escrita de “Memorial de Aires”;
— A importância de José de Alencar e Joaquim Nabuco na vida intelectual de Machado de Assis;
— O simbolismo do quadro “A Transfiguração” de Rafael.
Eu sei, leitor, é preciso paciência e paixão, pois é um romance saturado, na linhagem de Thomas Mann, meu autor predileto. Eu já disse e repito: é o livro que eu gostaria de ter escrito.