MONTE DE LEITURAS: blog do Alfredo Monte

09/01/2018

LEITURAS MARCANTES DE 2017: PARTE DOIS

(Uma versão da resenha abaixo foi publicada originalmente em A TRIBUNA de Santos em 09 de janeiro de 2017)

A literatura brasileira atual vai muito bem, obrigado. Veja por que:

Modos inacabados de morrer”, André Timm, Editora Oito e Meio: apesar de algumas ressalvas, um romance talentoso. Sobre um protagonista que sofre de narcolepsia.

A oração do carrasco”, Itamar Vieira Junior, Editora Mondrongo: contos cheios de momentos impactantes.

Miss Tatto”, Luiz Roberto Guedes, Editora Jovens Escribas: as aventuras e desventuras dos “tiozões”.

A Jaca do cemitério é mais doce”, Manoel Herzog, Editora Alfaguara: ainda são poderosas a pena da galhofa e a tinta da melancolia, como nos ensinava Machado de Assis.

Outros Cantos”, Maria Valéria Rezende, Editora Alfaguara: a obra-prima da grande escritora (prêmio Casa de Las Américas, prêmio São Paulo de Literatura e Jabuti).

Naufragar jamais”, Pedro Alberto Ribeiro (poeta em queda), Editora 11Editora: em cadernos soltos poemas de grande força.

Diário da Cadeia com trechos da obra inédita impeachment”: Eduardo Cunha (pseudônimo), Ricardo Lísias, Editora Record: o poder absoluto da ficção.

Machado”, Silvano Santiago, Editora Companhia das Letras: um romance que eu gostaria de ter escrito, um mosaico em torno dos anos de viuvez de Machado de Assis (prêmio Jabuti e prêmio Oceanos).

O passado é lugar estrangeiro”, Suelen Carvalho, Editora Patuá: uma estreante com voz própria.

Insolitudes”, Tiago Feijó. Editora 7Letras: contos humanos e irretocáveis.

Gotas no Asfalto”, Vlademir Lazo, Editora Penalux: expectativas frustrantes gerando boa literatura.

 

11/07/2017

UM LIVRO COM MOMENTOS MEMORÁVEIS

 

(Uma versão da resenha abaixo foi publicada originalmente em A TRIBUNA de Santos em 11 de julho de 2017)

Inicio esta resenha reiterando dois clichês: um, de ordem geral, a qualidade dos novos autores (quando se pensava que a língua estava em declínio, eis um rol de virtuoses) outro, especificamente, exaltando a fluência narrativa, apesar da densidade da prosa de “A ORAÇÃO DO CARRASCO”, de Itamar Vieira Junior.

Ele gosta de nos levar para o recôndito, quase alegórico em “A floresta do adeus”, uma cerca imensa de arame farpado surge do nada, separando gerações até perder sua aura: “As cercas entortam a cada dia, as pessoas se escoram sem medo, urdindo a queda lenta do que lhes separa, cada ferida aberta no metal vai se tornando parte de cada corpo, então não há importância se todos se ferem, os filetes de sangue deixam os corpos como minúsculas pétalas, petúnias encarnadas florescem na aridez da estrada, na luz morta da Floresta do Adeus”. Infelizmente, após um começo inspirado, Itamar enxerta páginas gratuitas que parecem esboço de um romance.

Também há problemas no conto-título, no qual os primogênitos herdam o oficio de carrascos. Há uma bela litania e depois uma cena brutal de iniciação marcada pelas sombras no solo. A seguir lemos uma mixórdia de proselitismos e filosofismos.

Em compensação “Alma” é um texto irretocável. Conta a fuga de uma escrava, embrenhada no sertão. A cruel ironia é que, malgrado seu nome, acompanhamos seu martírio físico, cada ferida. Em contraste: “Essas coisas boas, essas coisas tristes, nada sai de minha cabeça, vou lembrando as coisas, de cada filho que me levaram, aquele homem era como Inácio velho, Inácio que nunca será velho, ele podia se deitar aqui na tina, para ver se a imagem desse homem que pareceu na crueldade de meus senhores, cheios de rancores quando jogavam pragas ao vento por toda a riqueza que perderam”.

 

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