(Uma versão da resenha abaixo foi publicada originalmente em A TRIBUNA de Santos em 31 de outubro de 2017)
Neste “insosso século 21”, a jovem Alina, mesmo com pós-graduação, está subempregada em São Paulo. Compartilha as redes sociais com amigos e todos sabem tudo sobre todos. Mas na infância, ela via vultos sobrenaturais. Curiosamente embora tenha estudado cultos religiosos e esotéricos, após anos de racionalização, tornou-se descrente.
Chamada pela polícia para auxiliar no desvendamento de estranhos símbolos ligados a desaparecimentos, Alina cai na tentação de Fridolin de “Breve Romance de Sonho”, de Arthur Schnitzler, entrar num mundo ao qual não pertence. Participa de um ritual meio ridículo, contudo ela volta a vislumbrar um vulto.
“AS PERGUNTAS”, de Antônio Xerxenesky, mistura com inteligência essa incursão mística com uma rave, ou seja, o horizonte dos jovens urbanos, cínicos, que não acreditam em nada transcendente a não ser superficialmente. Mas como encarar o vulto despertado por Alina? Em meio ao vazio, ao lixo cultural, a um Zeitgeist, o espírito da nossa época, dominada por imposturas, simulacros e pastiches? As perguntas persistem.
“Foi uma evocação que deu errado? Uma invocação, pois parece estar grudada em mim? Foi um espírito inferior que entrou em nosso plano? Um quiumba? Mas eu nunca acreditei nisso, não é? Sempre li todos os ceticistas, sempre defendi uma visão materialista do mundo, não acredito em Deus desde que tenho uma opinião crítica mais ou menos formada, então por que me envolvi nisso? As sombras sempre estiveram comigo, sim, desde pequena, mas eu tinha aprendido a conviver com elas, tinha matado as sombras com a ciência, então por que estou fazendo tudo isso? Não é só porque bebi demais? Porque tinha uma droga na bebida? Porque fui influenciada por todo aquele mise-en-scène do ritual? Porque afrouxei minhas defesas, meu raciocínio lógico? Porque afoguei minha irônica e meu cinismo? Por outro lado, que espécie de vida é essa em que a ironia e o cinismo bloqueiam qualquer experiência? ”
Ainda prefiro “F”, seu romance anterior, porém “AS PERGUNTAS” confirma que Xerxenesky é um dos autores do momento.