(Uma versão da resenha abaixo foi publicada originalmente em A TRIBUNA de Santos em 01 de agosto de 2017)
Só existe o presente, afirma a madre superiora de um convento de carmelitas à protagonista de “O PASSADO É LUGAR ESTRANGEIRO”, o passado não existe mais. Mas é a presença maciça do passado que aflige Diana, desde o suicídio do marido, de quem descobriu um horrível segredo.
No seu romance de estreia, Suelen Carvalho correu o risco de cair na imitação de Clarice Lispector. Há vestígios disso. Felizmente, ela escapou da armadilha, escrevendo um relato ambientado em Belém do Pará, assim como Débora Ferraz em “Enquanto Deus não está olhando” com João Pessoa, vigorosamente moderno, urbano sem nenhum folclorismo.
“O PASSADO É LUGAR ESTRANGEIRO” se divide entre uma narrativa em terceira pessoa e um soliloquio que não respeita as margens da página. Acompanhamos a desagregação e isolamento de Diana, que passa a não suportar cores e lembranças, as quais se personificam em vultos. Por isso a compulsão de uma vida monástica que a aparte do passado, o qual ela sente fisicamente: “Ela calçava sandálias, que ficaram completamente sujas. O barro molhado em seus pés lhe causou asco, o que gerou uma grande pressa de voltar para casa e tomar um banho. Lama é uma coisa muito real para ser tocada”.
Suelen Carvalho é uma autora muito inteligente: ela alterna a encomenda de um hábito de freira com a recordação do vestido de noiva de Diana. E sua voz agônica vem se juntar à poderosa ficção feminina atual. A voz feminina está tão presente que se apropria da voz de autores masculinos. A heroína de “O PASSADO É LUGAR ESTRANGEIRO” podia ser irmã das personagens de Roberto Menezes, as de “Julho é um bom mês para morrer” e “Palavras que devoram lágrimas”.
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