(Uma versão da resenha abaixo foi publicada originalmente em A TRIBUNA de Santos em 22 de novembro de 2016)
(Ele espantado com ele mesmo, demorando para terminar aquele café da manhã, mais uma xícara, e mais uma.
Porque ele nota que não foi o xixi, o problema. Foi a ideia de que a garota estava achando o que ela falava importante).
Elvira Vigna deixa seus leitores, inclusive os críticos, como baratas tontas. Eu, por exemplo, já considerava “Por Escrito” o auge da sua produção, e eis que ela publica COMO SE ESTIVÉSSEMOS EM PLAIMPSESTO DE PUTAS¸ um livro ainda mais extraordinário e cruel, com suas recorrentes personagens de origem humilde que reinventam, mesmo carregando os traços do passado.
O incrível do romance é que ela parte de um fio mínimo de enredo: a narradora e João trocam intimidades no escritório prestes a ser fechado. João conta que conheceu uma garota de programa, Lola e casou-se com ela. Mas ele não conseguiu dominar a compulsão de procurar outras garotas de programa.
A partir daí nós vamos desvendando o passado e o futuro por várias décadas, tudo misturado labiríntico. A chave desse jogo exasperante, é que não apenas o vivido surge, como também o possível não-realizado; ou seja, as ausências são importantes quanto a existência “real”. Temos uma narradora que faz suposições, e lança hipóteses admitido que não tem controle das vidas de João e Lola. Por isso, as cenas são retomadas, e algum detalhe não percebido, muda toda a sua interpretação dos fatos, o que permiti que, nas suas últimas páginas, Elvira Vigna atinja o cume da prosa de ficção da literatura deste século.
Esperando uma nova obra perturbadora, eu me pergunto: Como não se descobriu que Elvira Vigna é a nossa maior escritora da atualidade?
“Lola fica lá, pensando, sozinha. E ela está um pouco triste porque risadas, principalmente as internas, quando acabam, é assim mesmo. Fica, na ausência delas, a tristeza que estava lá desde sempre”.
TRECHO SELECIONADO:
“Barulhinhos, ruídos.
Um recado que chega, uma bobagem dessas. Não era para ser nada. As garotas, um ruído de fundo na vida de João. Ia apagar o recadinho naquele dia mesmo, ou no outro. As perguntas também, apagadas, ou quase. Passadas por cima, outras coisas por cima”.
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Comentário por AntimidiaBlog — 23/11/2016 @ 5:08 |