(resenha publicada originalmente em A TRIBUNA de Santos, em 07 de setembro de 1999)
Sempre que leio um texto de Saul Bellow me vem à mente uma frase do monumental Tipos Psicológicos (um livro que poucas pessoas se animam a ler, o que é uma pena, pois é uma experiência extraordinária), de Jung: “…o que tende para fora tem de viver o seu mito,o que tende para dentro sonhará seu meio ambiente, a chamada vida real” (o que tende para fora= extrovertido; o que tende para dentro= introvertido).
A chamada vida real geralmente vem cobrar seu preço aos introvertidos protagonistas do autor de The actual- Presença de mulher (1997)—em tradução de Lia Wyler—,quebrando a auto-complacência deles de encontro aos aspectos mais sórdidos e degradantes da nossa existência, envolvendo-os em adultérios, divórcios, crimes e outros pecados.
No caso do protagonista-narrador de The actual, Harry Trellman esse encontro com a chamada vida real e seus aspectos menos “elegantes”, por assim dizer, acontecerá tardiamente por causa da sua peculiar relação com um milionário, Sigmund Adletsky, que utiliza em seu próprio proveito as observações de Trellman sobre o comportamento do rarefeito círculo de pessoas que eles conhecem.
Trellman, ao longo de sua vida, manteve-se apaixonado por Amy Wustrin (a qual casou com Jay, melhor amigo dele) e, a certa altura dos acontecimentos, ela começou a trabalhar para Adletsky, assessorando-o (como decoradora) na compra de imóveis.
A contraditória “presença” de Amy na vida de Trellman (realçada pelo mal escolhido título brasileiro) pode se constatada no seguinte trecho: “Objeto de amor seria o termo conveniente mais comum para indicar o que Amy se tornou para mim. Mas aonde isto leva? Suponhamos que, em lugar de dizer objeto de amor, disséssemos porta—que tipo de porta? Tem maçaneta, velha ou nova, lisa ou amassada, para onde abre? Investi nela meio século de sentimentos, fantasias, absorção, conversas imaginárias. Depois de quarenta anos de imaginação concentrada, sinto-me capaz de visualizá-la em qualquer momento de um determinado dia… Mas, uma vez, há uns dez anos, encontrei Amy inesperadamente e não a reconheci, a mulher com quem eu virtualmente mantinha um contato mental diário… Ela estava no mundo real. Eu não”.
O eixo do texto é um único dia, um dia gelado em Chicago, aquele em que Amy deve efetuar a transferência dos restos mortais do ex-marido (que comprara, numa brincadeira de mau-gosto, do pai dela, o túmulo ao lado da sogra). Antes, ela tem um compromisso com Adletsky, envolvido na compra de um novo apartamento. É ele quem sugere que Trellman faça companhia a Amy na sua desagradável tarefa no cemitério, possibilitando um dos mais inusitados pedidos de casamento da ficção.
E na narração desse dia de reencontro para Amy e Trellman emerge alguns desagradáveis elementos que compõem a vida real, da qual ele sempre se sentiu “exilado” (mesmo em aparência: judeu, ele tem no entanto uma aparência “oriental”, lembrando para alguns um chinês e para Adletsky um japonês): Jay Wustrin, o falecido, gravara as relações sexuais de Amy com um amante ocasional e usara as fitas no tribunal para deixá-la sem nada.
O apartamento cuja mobília Amy e Adletsky vão vistoriar e discutir o preço pertence ao casal Heisinger. Madge Heisinger tem no seu currículo anos de prisão como mandante da frustrada tentativa de homicídio contra o marido e pretende dar o dinheiro da venda para o amante que tentou efetivar o assassinato.
O próprio e finado Wustrin adorava mostrar a Trellman um marido cuja esposa ele já “traçara”. O início da curiosa ligação dangereuse entre Trellman e Adletsky teve como estímulo a discussão das humilhações sofridas por uma mulher distinta, Francis Jellicoe, que ambos admiram, em função da sua paixão por um marido imprestável que engravidara uma esquimó da Groenlândia…
Mesmo mantendo-se num plano quase ascético nessa área sentimental (ao contrário de alguns famosos protagonistas de Bellow, como os de Herzog & O legado de Humboldt), Trellman oculta certas irregularidades nos seus negócios que apenas ficam insinuadas na narrativa.
O toque de gênio de The actual, que evoca as maiores realizações do esplêndido autor de O planeta do Sr. Sammler, é que mostrando como o intrrovertido Trellman sonha a “vida real”, quase que a contragosto, ele também consegue mostrar os mitos que iludiram e tornaram teatral e falseada a vida de pessoas mais ajustadas, não-exiladas do jogo da existência social, como o próprio marido de Amy, e até ela mesma, como se pode constatar na cena em que Trellman não a reconhece na rua, apesar de ter pensado nela todos os dias durante décadas: “Para ela foi um golpe terrível… E quis dizer com isso que, se eu não a reconhecia, ela já não era a mesma pessoa. Ela, que anda se apresentava ou, como se diz, vendia a imagem que costumava ter, fora apanhada em uma impostura”.
Ou mais adiante: “Esta manhã Amy usava muita maquiagem, especialmente em torno dos olhos, onde precisava mais. Seu rosto redondo estava calmo, embora sua máquina de calcular interior estivesse funcionando em alta velocidade… era óbvio que ela ainda controlava a aparência; suas peculiaridades e faculdades estavam como reses no curral, sob suas vistas”.
Muito embora o blog seja voltado para a literatura foi aqui que encontrei as melhores considerações sobre a série Law & Order. Assim, retorno para postar algumas novidades sobde a sua sucessora.
A NBC agendou para o dia 11 de abril a volta ao ar da série “Law & Order: Los Angeles”. O programa retorna com um episódio especial de duas horas de duração.
Em dezembro, “Law & Order: L.A.” foi suspensa pelos baixos índices de audiência, durante o curso de sua 1ª temporada. Neste ínterim, houve uma grande reformulação no elenco. Foram dispensados os atores Skeet Ulrich, Regina Hall e Megan Boone.
Alfred Molina, que fazia participações esporádicas na trama,ganha mais destaque. Seu personagem, o promotor público Ricardo Morales, voltará ao cargo de detetive. Ele será o novo parceiro do personagem de Corey Stoll.
Apenas Terrence Howard,continuará como promotor. Alana De La Garza, que interpretava a assistente de promotoria Connie Rubirosa na série “Law & Order”, entrou na nova série com o mesmo papel, trabalhando para Dekker. Ela cobre o vazio deixado por Megan Boone.
Deviam aproveitar para escalar Sam Waterston como novo chefe da promotoria. Será que conseguirão salvar a série com tais reformulações?
Comentário por Ronaldo — 12/04/2011 @ 7:39 |
Caro Ronaldo, embora não saiba bem o que Law& Order tenha a ver com Saul Bellow, devo dizer que já tinha desistido de ver Law & Order-Los Angeles, que é muito ruim, só se salvando Corey Stoll e Terrence Howard, o resto de uma inexpressividade de fazer dó.
Mas eu adoriaria rever Alana de la Garza, a inesquecível e linda Connie Rubirosa.
Comentário por alfredomonte — 12/04/2011 @ 15:47 |
Ah, mais uma coisa, Ronaldo. Acho que há um problema basicamente estético, de linguagem, no LAW & ORDER-LO ANGELES, a fotografia não combina, não sentimos aquela austeridade fotográfica que faz parte da mítica da série, e seu ritmo rapidinho e seu visual ensolarado não “cola”.
Obrigado pelas informações. Um grande abraço.
Comentário por alfredomonte — 13/04/2011 @ 10:19 |