Gostei muito dos dois primeiros livros de José Roberto Torero, O Chalaça & Xadrez, truco e outras guerras, assim como de sua associação com Marcus Aurelius Pimenta em Terra Papagalli. Depois. confesso que, à exceção de Pequenos Amores, não me interessei particularmente pelos rumos da produção de Torero, individual ou em dupla.
Quando soube que os dois lançariam um novo romance, após muitos anos, e que seria um Evangelho de Barrabás (apesar de haver uma obra-prima sobre o assunto, Barrabás, de Pär Lagerkvist, que li quando garoto e que tem a mesma atmosfera de crucificação existencial dos livros de Kazantzakis, só que num estilo mais sintético e límpido), fiquei na maior expectativa, já que, na avalanche dos últimos anos de evangelhos “encontrados” (além de inúmeras obras de ficção; uma de que nunca mais ouvi falar e que achei excelente foi um Evangelho de Lázaro –1972-,de Orígenes Lessa) de tantos personagens do Novo Testamento, eles seriam, decerto, os mais capazes de lidar com o desafio de produzir um com a irreverência e o mesmo espírito moleque de um Saramago, em Caim.
Criando uma narrativa picaresca sobre a vida do bandido que foi poupado pela multidão, os dois fazem da trajetória de Barrabás uma espécie de vida de Jesus em negativo: ambas as famílias viajam para o censo romano e ambos nascem ao mesmo tempo, num lugar humilde, de uma mãe “virgem”, Maria, e de um pai chamado José, são tidos como “ungidos”, sobrevivendo à ordem de execução de todos os meninos, decretada por Herodes.
Ao longo do relato, os eventos da vida de Barrabás sempre tangenciam os da vida nosso salvador: temos os discípulos, na verdade asseclas de um bando burlesco (e ele, pilantra que é, se torna um falso profeta, realizando curas de araque, venda de relíquias sagradas, enfim, toda a parafernália que a igreja católica instituída tornaria respeitável mais tarde), Maria Magdalena, seu grande amor, parábolas, famosos episódios bíblicos, milagres e trechos dos evangelhos, dos Cântico dos Cânticos, colocados na boca dos personagens com um tom de troça, e até uma referência ao episódio do almocreve de Memórias Póstumas de Brás Cubas, para que não nos esqueçamos do pai literário, pelo menos de Torero.
O grande problema é que se, em Caim, houve irreverência e molecagem, é porque o assunto era levado a sério, através de um gume bem machadiano. Tive a impressão o tempo todo de que Torero-Pimenta não tiveram coragem de levar sua irreverência a sério, de realmente entrar fundo no texto bíblico e parodiá-lo de fato, subvertê-lo. Lê-se O evangelho de Barrabás como se lê as gracinhas de um adolescente ou como se consume o agora onipresente tipo de humor de tevê, muito chegao do ao chulo e ao óbvio. Não há um momento em que nos afastamos da diversão inócua e inofensiva, da molecagem (no sentido retardatário, de descompasso com a idade dos autores, que são da minha geração, a dos quarentões), e há passagens realmente muito bobas, como a cena em que Barrabás, “andando sobre as águas”, se transforma num surfista: “Usando de habilidade, ele conseguiu se equilibrar sobre o madeiro, pondo-se de joelhos. Depois ficou em pé, abriu os braços em forma de cruz e começou a deslizar sobre a crista da onda…” As últimas páginas, que poderiam ser muito fortes, perdem muito na comparação com o final, similar, de O perfume, de Patrick Süskind. Mesmo assim, é um momento que nos dá a nostalgia do que O Evangelho de Barrabás poderia ter sido.
Se a intenção de Torero-Pimenta, era essa, contentando-se com algo engraçadinho e bonitinho (embora muito próximo do besteirol), tanto quanto os “mandamentos” da quarta capa (por falar nisso, a edição traz ótimas ilustrações de Paulo Brabo), tudo bem. Mas para a aguardada volta deles ao romance, e com o estilo e talento que eles têm de sobra, é muito pouco e principalmente decepcionante.
(uma versão da resenha acima foi publicada originalmente em “A Tribuna” de Santos, em 21 de setembro de 2010)
Como é bom ter o Alfredo para ler e nos falar sobre
os livros. Poupa-nos tempo de ler o que não é bom
livro.
Esse tal aí sobre Barrabaz, segundo sua apreciação,
não é para perder tempo nem dinheiro, claro.
Que pena, uma figura tão forte da biblia, ser assim
maltratada.
Comentário por maria amelia — 20/09/2010 @ 12:17 |
Sinceramente, parece que quem fez a resenha acima não leu o livro. O evangelho de Barrabás é paródia da melhor qualidade, inteligente, sutil e não depreciativa. Tão cheia de detalhes, de referências literárias…
Um pouco mais de cuidado seria bacana, ao falar de um trabalho tão cuidadoso.
Comentário por Ariadne — 21/09/2010 @ 23:09 |
Obrigado pelo seu comentário. Abraço, Alfredo.
Comentário por alfredomonte — 26/09/2010 @ 16:28 |
A tropa de choque do ateísmo entra em ação! Está na moda e trata-se de uma raça supra-sumo da humanidade – é até chic ser ateu! O resto é alienação, burrice… O tal do gerador de partícula que literalmente enterrou zilhões de dólares nas profundezas da Europa chegou a conclusão que ainda não dá pra ver como o universo foi feito… E aí?!
Os “deuses” terráqueos nunca conseguiram passar da esquina da Lua…
Comentário por Isaias Bonifácio — 09/10/2011 @ 12:10 |
Desculpe-me, amigo, mas acho tudo isso que você escreveu uma grande bobagem. Obrigado pelo comentario.
Comentário por alfredomonte — 09/10/2011 @ 16:24 |
Olá preciso para um trabalho saber A Situação Inicial, Conflito, Climax e o desfecho do Livro o Chalaça
E os elementos que compõem a narrativa
Enredo
Personagens
Tempo
Modo
Lugar
Causa
Consequência
Foco Narrativo
Comentário por Amanda — 13/04/2015 @ 13:18 |
https://armonte.wordpress.com/2012/07/12/o-virtuoso-conselheiro-gomes/
Comentário por alfredomonte — 13/04/2015 @ 16:27 |